Homilia de D. Nuno Almeida na Solenidade da Senhora das Graças | Diocese Bragança-Miranda

Senhora das Graças

Catedral de Bragança, 22.08.2023

(Is 9, 1-6; Gl 4, 4-7 e Lc 1, 26-38)

Introdução

Irmãos e irmãs, sob o olhar amoroso e sob o manto materno da Senhora das Graças, vivemos este feliz encontro. É um dia especial no nosso caminho, em que brilha a estrela de Maria Mãe de Jesus, Mãe da Igreja e Nossa Mãe e Padroeira: “sinal seguro de esperança e alegria para todos”.

De novo somos acolhidos, nesta Catedral, hoje ainda mais bela pela presença de todos: Bispos, sacerdotes, diáconos, consagrados e consagradas, autoridades … a todos saúdo!

Que a Senhora das Graças, com o seu olhar de mãe, nos faça crescer em cada dia, na santidade comunitária ou sinodal.

 

Homilia

 

1.Olhamos para Maria, Senhora das Graças, com alegre admiração e gratidão porque é por meio dela que também nós podemos conhecer o mistério da descida do Espírito, o amor imenso do Pai, a vinda de Jesus, Filho do Altíssimo.

Olhamos para Maria, Senhora das Graças, como mãe e modelo que nos faz compreender a finalidade do nosso caminho sobre a terra, de toda a história humana e do universo: sermos verdadeiros filhos de Deus Pai, movidos apenas pelo amor do Espírito e com Jesus Cristo, em nós e entre nós, procuramos testemunhar e anunciar a fraternidade. Foi o que escutámos na segunda leitura (Gl 4, 4-7): “Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: ‘Abbá! Pai!”.

Olhamos para Maria, que sob o título de Senhora das Graças ou da Divina Graça, é desde 1856 a padroeira muito amada e venerada da nossa cidade de Bragança, desde 2001, a titular da Catedral e desde 2012 dá nome à Unidade Pastoral.

Olhamos para Maria, Senhora das Graças, para a saudarmos como Mulher admirável que deu à luz o Filho de Deus, príncipe da paz, como Rainha do Céu, Mãe da Misericórdia e Causa da Nossa Alegria.

 

2.A primeira palavra do Anjo, na Anunciação, não é uma simples saudação de circunstância. Dentro dela vibra algo de bom e raro que todos nós, todos os dias, procuramos: a alegria. “Chaire, alegra-te, exulta, sê feliz!” O Arcanjo Gabriel não pede: “Reza, ajoelha-te, faz isto ou aquilo”, mas simplesmente, “abre-te à alegria”, tal como uma janela se abre ao sol. Deus aproxima-se, trazendo consigo uma promessa de felicidade!

A segunda palavra de Gabriel revela o porquê ou a razão da alegria: “Estás cheia de graça”. Um termo novo, que jamais ressoara na Bíblia ou nas sinagogas, literalmente inaudito e inédito, a ponto de perturbar Maria: “estás cumulada, cheia de Deus”. Deus que se inclinou sobre Maria, se enamorou dela, se deu a Ela e é por isso Senhora das Graças.

A primeira palavra de Maria não é um sim apressado, mas uma pergunta: “Como é possível?” Maria está diante de Deus com toda a sua dignidade humana, com a sua maturidade de mulher, com sua necessidade de entender. Usa a inteligência e, depois, pronuncia o seu sim, que passa a ter a força de um sim livre, criativo e total: um SIM MAIOR!

 

3.“Maria disse então: Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra”. A fé de Maria é forjada na mais alta e perfeita contemplação e no serviço mais concreto, atento e humilde. Maria oferece-nos assim a chave da santidade, o seu segredo: vivermos centrados na Vontade de Deus e no amor ao próximo, nunca em nós mesmos!

Maria tem uma atitude contemplativa de escuta e de decisão e de ação quer diante do mistério divino, quer perante as simples realidades da vida de cada dia.

É este o caminho de alegria que a Senhora das Graças nos convida a trilhar: Permanecermos, também nós, na mais alta e apurada contemplação e descoberta da Vontade de Deus e, ao mesmo tempo, caminhar unidos ao lado de cada um. Fazermos da nossa vida uma peregrinação em direção a Deus e aos irmãos.

Maria escuta, decide e atua! Peçamos-lhes a graça da harmonia entre o pensar o sentir e o agir, ou a da harmonia entre a inteligência o coração e a ação.

Maria, Senhora das Graças, ensina-nos a olhar para o alto e para o lado, para os que estão à nossa volta para nos fazermos próximos, conscientes de que são verdadeiras as palavras do Papa Francisco na “Alegria do Evangelho”: “Sair de si mesmo para se unir aos outros faz bem. Fechar-se em si mesmo é provar o veneno amargo da imanência, e a humanidade perderá com cada opção egoísta que fizermos” (EG 87).

Aprendamos de Maria, Senhora das Graças, a fé segura (“Eis a serva do Senhor”); a esperança confiante em Deus (“nada é impossível a Deus”); a caridade missionária (“Maria pôs-se a caminho apressadamente”).

 

4.Daremos uma grande alegria à nossa Mãe e Padroeira se procurarmos “tecer comunidades acolhedoras, unidas e missionárias”. Tudo parte da disponibilidade de nos pormos à escuta da Palavra de Deus, juntamente com os que estão à nossa volta, para que a Palavra dê sentido à nossa vida e sejam vividas com beleza as circunstâncias festivas e enfrentados com coragem os momentos de prova e sofrimento. Confiamos à Senhora das Graças a promessa e o sonho de que se multipliquem, na nossa Diocese, pequenas comunidades ou grupos ao redor da Palavra de Deus, que sejam “Grupos Semeadores de Alegria” no coração de cada um, nas famílias, nas comunidades cristãs e na sociedade. Que se realize, na nossa Diocese, a profecia de Isaías (Is 9, 1-6), escutada na primeira leitura: “Multiplicaste a sua alegria, aumentastes o seu contentamento”, porque “um menino nasceu para nós” e “uma luz começou a brilhar”!

Como são interpeladores das palavras de Charles Péguy: “Jesus Cristo, meu filho, não nos deu palavras em conserva para guardar. Mas deu-nos palavras vivas para nos alimentar. Alimentadas, trazidas, aquecidas, quentes num coração vivo. E não conservadas no mofo, em caixas de madeira ou cartão.

Como Jesus tomou, como teve de tomar corpo, de revestir-se de carne, para pronunciar as palavras (carnais) e para fazer entendê-las, para poder pronunciá-las, e nós, também nós, à imitação de Jesus, também nós somos carne e devemos aproveitar o facto para conservá-las, lhes darmos calor, para alimentá-las em nós, vivas e carnais.

Devemos alimentar com a nossa carne, com o nosso sangue e com o nosso coração as Palavras eternas, temporalmente, carnalmente pronunciadas. (…) As palavras que sem nós morreriam descarnadas” (Charles Péguy, Os Portais do Mistério, pp. 81-82).

 

5.Vale a pena voltar às palavras finais do Papa Francisco, em Fátima, durante a Jornada Mundial da Juventude: “Gostaria que hoje olhássemos para a imagem de Maria, e cada um se interrogasse: Que me diz Maria como Mãe? O que é que me está a indicar? Indica-nos Jesus; às vezes indica também que alguma coisa no coração não regula bem, mas sempre indica. «Mãe, o que é que me estás a indicar?» Façamos um breve momento de silêncio e cada um diga em seu coração: «Mãe, o que é que me estás a indicar? O que há na minha vida que Te preocupa? O que há na minha vida que Te entristece? O que há na minha vida que Te chama a atenção? Indica-mo!» E Ela indica o coração, para que Jesus venha até ele. E assim como nos indica Jesus, a Jesus indica o coração de cada um de nós.

Queridos irmãos, sintamos hoje a presença de Maria Mãe; a Mãe que não cessa de dizer: «Fazei o que Jesus vos disser»; indica-nos Jesus. Mas também a Mãe que diz a Jesus: «Faz o que estes Te estão a pedir». Esta assim é Maria. Esta é a nossa Mãe, Nossa Senhora solícita em estar perto de nós. Que Ela nos abençoe a todos!

 

Maria na tradição da Igreja é apresentada como âncora segura no meio das tempestades e também como vela que é impulsionada docilmente pelo vento do Espírito!

 

Virgem Imaculada, Senhora das Graças,

Ensina-nos a esvaziar o coração e a mente

De todas as vaidades.

Cheia de Graça,

Torna-nos capazes de acolher

O Deus que vem.

Toda Santa,

Fica entre nós

Como entre os discípulos no Cenáculo

A pedir a descida do Espírito.

Mãe da fidelidade e da ternura,

fica nas nossas casas.

Mãe de Deus,

Leva os teus filhos contigo

Para o seio do Pai.

Santa Maria, Senhora das Graças,

Reza por nós pecadores,

agora sempre. Ámen.

 

+Nuno Almeida

Bispo de Bragança-Miranda