Domingo de Ramos na Paixão do Senhor | Homilia de D. Nuno Almeida | Diocese Bragança-Miranda
Domingo de Ramos
Catedral de Bragança, 24.03.2024, 11.00h
Homilia
Queridos irmãos e irmãs reunidos na Catedral de Bragança-Miranda! Esta nossa assembleia alarga-se a todos os que nos acompanham pela Rádio Renascença. A todos saudamos com afeto, especialmente os doentes e os idosos mais sós, mas também os nossos imigrantes, as famílias que enfrentam mais dificuldades e todos os que viajam.
1.Depois de termos escutado a impressionante narração da Paixão do Senhor, o que há ainda que acrescentar ou explicar? Está tudo dito! Quem atentamente seguiu este relato do Evangelho foi certamente tocado profundamente. Quem escutou verdadeiramente este relato da paixão redescobriu o amor divino revelado por Jesus que entrega a vida por amor a cada um de nós.
Cristo na sua humildade triunfa! Cristo na sua entrega à morte redime-nos pelo seu sangue. Deus ama-nos até este limite de entregar o Filho por amor.
Muitos foram os sofrimentos de Jesus e, sempre que ouvimos a narração da paixão, penetram-nos na alma. Foram sofrimentos do corpo: pensemos nas bofetadas, nas pancadas, na flagelação, na coroa de espinhos, na tortura da cruz. Foram sofrimentos da alma: a traição de Judas, as negações de Pedro, as condenações religiosa e civil, a zombaria dos guardas, os insultos ao pé da cruz, a rejeição de tantos, a falência de tudo, o abandono dos discípulos. E, contudo, no meio de todo este sofrimento, restava a Jesus uma certeza: a proximidade do Pai. Mas acontece também o impensável; antes de morrer, clama: «Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?» O abandono de Jesus.
2.Tudo culmina no grito de solidão sobre a cruz: “Meu Deus, porque me abandonaste?” Somos todos desafiados, especialmente nesta Semana Santa, a abraçar a Cruz de Jesus, deixando-nos abraçar por Ele. Do alto da Cruz, Jesus já não ensina as multidões com a Palavra, mas abre os braços a todos. O gesto da Cruz, o gesto dos seus braços estendidos, é um abraço do Céu à Terra. Na Cruz, Jesus abraça o mundo inteiro. E assim mostra-nos que o nosso Deus é verdadeiramente um Deus de braços abertos!
3.Caminhemos juntos com Jesus. Jesus convida-nos a fazer este Caminho com Ele. Ele caminha connosco, caminha no meio de nós. Nós não caminhamos sozinhos; caminhamos juntos, caminhamos com Ele e caminhamos com aqueles que o Senhor colocou ao nosso lado como companheiros de viagem. Umas vezes, a multidão vai à frente, porque Jesus fica para trás, a procurar e a levantar quem se perdeu ou caiu. Outras vezes, a multidão acompanha Jesus, porque Jesus está sempre no meio de nós e pisa o nosso chão. Mas todos os que seguimos Jesus, como discípulos do Único Mestre, somos convidados a ir atrás d’Ele, porque Ele próprio se torna o Caminho. Não desistamos de caminhar com Ele e de caminhar unidos. Não abandonemos a comunidade. Particularmente nesta Semana Santa e nesta Páscoa: caminhemos juntos com Jesus!
4.A Semana Santa, o Tríduo Pascal (Quinta, Sexta e Sábado Santo) e o Tempo da Páscoa (que se prolonga por cinquenta dias) não se celebram apenas na liturgia (sacramentos e liturgia das horas), mas também com devoções populares que podem contribuir para expressar e fomentar a fé do povo de Deus no mistério pascal.
Basta pensar nas procissões e dramatizações, da Paixão, do Enterro do Senhor, na Via Sacra, na Visita Pascal e outras. Muitas destas formas de religiosidade popular são admiráveis e serviram para manter a fé do povo cristão, especialmente quando as celebrações litúrgicas se tornaram difíceis de compreender.
Porém, temos de reconhecer que hoje é necessário agir com discernimento, para que não se troque o essencial pelo secundário. O que é central é a celebração do mistério pascal: a pessoa de Jesus Cristo, a prioridade da Vigília Pascal, a estreita ligação entre Quaresma-Semana Santa e as sete semanas do Tempo Pascal que se conclui com o Pentecostes.
Se às procissões se dá mais importância do que à Vigília Pascal, se na Cruz não se contempla já o Ressuscitado, se a bênção dos Ramos, do fogo ou da água se destacam mais do que o resto da celebração, se a preparação do “folar” e da “visita pascal” valem mais do que a participação na Missa de Páscoa …, então será necessário tentar purificar e reorganizar estas manifestações que, sem lhes tirar o mérito, não podem abafar a riqueza do mistério pascal.
Vejo-te subir, Senhor,
no dorso de um jumento
enquanto a multidão exulta
de alegria e, bem alto, clama:
«Bendito Aquele que vem...»
Já o tinha dito Isabel quando estavas ainda no seio de Maria.
Aquele grito ressoa, agora,
jubiloso, num povo
que diz que te ama.
Estão todos presentes, Senhor:
a adúltera, a ovelha perdida,
o filho pródigo arrependido,
o filho mais velho soberbo;
estão presentes delinquentes,
pecadores, crianças inocentes,
choros de mulheres e pedidos
de sábios e poderosos.
Chegaste ao cimo do monte
e espera-te a Cruz:
o grito do homem apaga-se
e a euforia deste instante
desaparece de maneira fugaz!
A Cruz, Senhor: a Cruz,
única chave do nosso resgate,
fogo de amor perene,
que queima os pecados
do mundo,
Luz que resplandece
também para mim, para nós!
Ámen.
+Nuno Almeida
Bispo de Bragança-Miranda