Intervenção de D. Nuno Almeida no Encontro com agentes pastorais diocesanos | 16.09.2023 | Diocese Bragança-Miranda
SÍNTESE DA INTERVENÇÃO NO ENCONTRO DOS AGENTES PASTORAIS DA DIOCESE
Seminário de S. José e Casa Pastoral, 16.09.2023
PROJETO PASTORAL 2023-26 EM CONSTRUÇÃO
(Igreja não é museu, mas “estaleiro”)
O Sínodo, que o Papa Francisco convocou, é, antes de tudo, para reacender e espalhar o fogo do amor recíproco, que torna acessível a presença de Jesus Ressuscitado no meio de nós. O objetivo principal, deste importante acontecimento em que temos a alegria de participar, não é o de acrescentar ou multiplicar documentos, estruturas e atividades, mas, antes de tudo, fazer-nos experimentar uma nova maneira de nos relacionamos nos vários âmbitos onde vivemos e trabalhamos.
Estamos, então, todos convocados, pelo Papa Francisco, para uma “peregrinação” especial, pois “sínodo” significa caminhar juntos, num projeto concreto e exigente de conversão comunitária. O Sínodo prepara-se, celebra-se e vive-se em comunhão!
Comunhão é unidade na diversidade e diversidade na unidade. Cada comunidade cristã é chamada a ser Sacramento de Salvação: transparência do divino no humano, ou seja, sinal e instrumento da comunhão de Deus com os homens e dos homens entre si, pois a causa e a meta da ação de Jesus é reunir os filhos de Deus dispersos (cf. Jo 11, 52) e conduzi-los à unidade com Deus e de uns com os outros.
Constatamos que na Igreja são possíveis dois extremos; e ambos se chamam egoísmos. Verificam-se, respetivamente, quando cada um ou quando só um pretendem ser tudo. Neste último caso, o vínculo da unidade é tão apertado e o amor tão sufocante que não se pode evitar extingui-lo; no primeiro caso, tudo é tão desconexo e frio que o gelo é insuportável. Um destes egoísmos gera o outro. Mas nem um só nem cada um podem ser o todo. Só todos constituem o todo e só a comunhão que gera a unidade de todos forma uma totalidade.
É bom recordar as sábias palavras de um pastor, que foi perseguido e preso, na década de setenta do século passado: “A comunhão é um combate de cada instante. A negligência de um só momento pode despedaçá-la, basta um nada; um pensamento sem caridade, um julgamento obstinadamente conservado, um apego sentimental, uma orientação errada, uma ambição ou um interesse pessoal, uma ação em prol de si mesmo e não para o Senhor. (…) Ajuda-me, Senhor, a examinar-me assim: Qual é o centro da minha vida? Tu ou eu? Se és Tu reunir-nos-ás na unidade. Se vejo que à minha volta, pouco a pouco, todos se afastam e se dispersam, é sinal de que eu próprio me coloquei no centro dos interesses” (Card. F.X. Van Thuan).
1.”ESTALEIRO” DO PROJETO PASTORAL
(Que ninguém diga: “estou-me nas tintas para o projeto pastoral!)
Procuremos elaborar juntos, sinodalmente, o Projeto Pastoral 2023-26 e o Plano Pastoral para 2023/2024. Temos consciência de que ainda não nos é possível perceber, em toda a sua extensão, o impacto pastoral da JMJ e os frutos do processo sinodal em curso. Mas é possível, pelo menos, a partir da fase diocesana do processo sinodal e do Instrumentum Laboris, da experiência da JMJ e dos vários dinamismos pastorais suscitados por este grande evento eclesial, perceber alguns sinais indicadores para a nossa vida pastoral, nomeadamente:
1.A necessária força congregadora e mobilizadora de um grande objetivo comum ou de um desígnio maior, de metas concretas, de prioridades pastorais, seja a nível paroquial, unidade pastoral, arciprestal ou diocesano. Envolvendo também os movimentos, obras e novas comunidades.
2.A relevância da dimensão simbólica, alegre e festiva da fé, com as suas novas linguagens e expressões.
3.O apreço pela cultura do encontro, do acolhimento, da convivialidade.
4.A eficácia pastoral do trabalho em rede, do envolvimento e da participação ativa de todos e da reorganização das estruturas pastorais, segundo o princípio da subsidiariedade.
5.A atualidade de uma nova etapa evangelizadora marcada pela alegria (cf. EG 1). Todos têm direito à alegria do Evangelho e nós temos obrigação de nos unirmos para a anunciar, celebrar e testemunhar!
Somos todos convocados para participar, unidos e com alegria, num processo de discernimento pastoral:
1.Reconhecer e registar aspetos da vida social e religiosa que revelam mudanças importantes.
2.Apontar elementos para interpretar a vida social e pastoral em mudança a partir da Palavra de Deus e do Magistério do Papa Francisco, especialmente da EG, do IL do Sínodo, etc. Há que ter presente a visão de Igreja e o respetivo modelo pastoral.
3.Decidir sobre um objetivo geral para o próximo triénio, bem como metas para cada ano e prioridades de ação.
“Queríamos ver Jesus” (Jo 12, 21). Este pedido de um grupo de gregos aos discípulos, em Jerusalém, continua a ressoar hoje aos nossos ouvidos para que que não só falemos de Cristo, mas também de certa forma O façamos “ver”. “Não é porventura a missão da Igreja refletir a luz de Cristo em cada época da história e por conseguinte fazer resplandecer o seu rosto também diante das gerações do nosso tempo?” (NMI 16). Muito mais do que a “eficiência” é, portanto, decisiva a “transparência”.
2.CULTURA DE VIGILÂNCIA
Não deveria haver na Igreja e na sociedade: vítimas de abusos sexuais, de poder e de consciência. Não deveria haver abusadores na Igreja. Mas porque, desgraçadamente, houve, há e haverá: não pode haver atitudes de desleixo e de encobrimento.
Nisto estamos todos de acordo e ainda bem. Mas situamo-nos no discurso, na proclamação de princípios.
Mas este tema, extremamente desagradável, exige para além do discurso: ação. E preciso agir, em conformidade com as leis civis e com a última versão do Vademécum.
Agir dói muito. Dói muito ouvir vítimas. Na noite anterior não se dorme bem, quando é preciso falar e acompanhar um sacerdote que, alegadamente, abusou de menores. Dói muito termos de comunicar às autoridades civis e eclesiásticas. Dói muito porque pode haver vítimas e podem também existir efeitos colaterais de injustiça, erros, etc.
Aqui deixou um veemente apelo, um agradecimento e um pedido:
Um apelo: Temos de estar unidos no discurso e na ação!
Agradecimento a quem tem sofrido por ter quebrado e silêncio e a quem tem agido na Comissão de Proteção, etc.
Pedido de um Manual de Boas Práticas e de Formação.
Perguntemo-nos: de que temos medo? Há medos legítimos e medos que nos fazem mergulhar na cobardia e na cumplicidade.
Medo legítimo é o de que possa continuar a haver vítimas, ou medo da impreparação perante algo tão grave, medo do desleixo.
Há medos ilegítimos, como, por exemplo, o de beliscar a imagem da Igreja.
Se as vítimas e quem tenha indícios de abusos não quebram o silêncio, os abusos poderão continuar:
-Perante indícios de crime, não hesitar em avisar as autoridades civis (Ministério Público, GNR, PSP e eclesiásticas (Comissão Diocesana de Proteção, o Bispo ou Vigário-Geral da Diocese; ou, a nível nacional: o “Grupo Vita” e a Procuradoria-Geral da República).
4.PASTORAL DOS JOVENS SINODAL E VOCACIONAL
Acolher os jovens e não ter medo de propor um caminho vocacional na vida sacerdotal, missionária, religiosa e matrimonial.
Possivelmente, os jovens têm, atualmente, mais dificuldade em seguir modelos e ideais, mas procuram avidamente experiências e vivências. Não querem tanto ouvir testemunhos, mas sobretudo sentir realidades. Isto está de acordo com a dimensão “evenencial” da fé cristã, ou seja, a fé, como dizem os nossos irmãos brasileiros, está acontecendo.
Se isto é verdade, a atitude fundamental terá de ser a de “perder” tempo com os jovens: conhecê-los, ouvi-los e crescer com eles.
Que o amor pelos seminários seja expresso em gestos de oração, de afeto e de partilha material generosa. Sobretudo, convidemos os adolescentes e jovens para conhecer os nossos Seminários!
+Nuno Almeida, Bispo de Bragança-Miranda
Fotografia: Irene Rodrigues